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REALIDADE SUPLEMENTAR: AMBIENTE LÚDICO DE APRENDIZAGEM E A RECOGNIÇÃO

Antonio dos Santos Andrade

Atualizado: 6 de jan. de 2024

I

Em post anterior (APRENDIZAGEM COMO AFETO E DESEJO), nos referimos que, para favorecer uma Aprendizagem tal como concebida por Gilles Deleuze, era indispensável, além de favorecer que o professor se tornasse intercessor, alterar o ambiente de aprendizagem para favorecer a desterritorialização. Neste post pretendemos mostrar os ambientes lúdicos, e entre eles, o de Realidade Suplementar, ou faz-de-conta, como o mais adequado ao alcance de tais objetivos. Apresentaremos as concepções sobre o lúdico de quatro autores clássicos da área e então trataremos daquela proposta por Gilles Deleuze.


Jean Piaget (1896-1980)
Jean Piaget (1896-1980)

Jean Piaget (1896-1980), em seu livro “A Formação do Símbolo na Criança” (Piaget, 1975) denomina jogo simbólico às atividades das crianças que se passam nas representações de ações, situações e fatos de sua vida, numa situação de faz-de-conta, cuja função é torná-la capaz de representar um significado (objeto, acontecimento) por meio de um significante diferenciado e apropriado à representação que realiza. Em sua obra diferencia três fases evolutivas do jogo simbólico, cada uma delas dividida em subfases. Destaca que, inicialmente, a criança age no jogo simbólico com um pensamento classificado como egocêntrico e que ao final já é capaz de realizá-lo segundo um ponto de vista socializado.

Para Piaget o brinquedo ou jogo simbólico é interpretado como uma experiência que leva a criança a desenvolver suas representações, desligando-a da ação motora, típica do estágio anterior, uma vez que o jogo simbólico é típico do período pré-operatório, na preparação para a aquisição da lógica conceitual que virá nos dois estágios subsequentes, operações concretas e operações formais. Coerente com sua concepção de um desenvolvimento direcionado ou de sentido obrigatório, situa o brinquedo como jogo simbólico num estágio específico e sua contribuição num aspecto limitado, aquele de produzir as representações simbólicas que mais tarde levarão às operações.


Lev S. Vygotsky (1896-1934)
Lec S. Vygotsky (1986-1934)

Para Lev S. Vygotsky (1896-1934), em “Formação Social da Mente (Vygotsky, 1998), a criança recorre ao brinquedo, característico da idade pré-escolar, para resolver a tensão resultante do surgimento de desejos que não podem ser imediatamente satisfeitos ou esquecidos, num mundo ilusório e imaginário no qual os desejos que não eram realizáveis podem agora ser realizados. Nesse mundo, tudo que na vida real pode passar despercebido pela criança, se torna uma regra de comportamento, sendo que inicialmente a situação imaginária é clara para a criança, mas as regras permanecem ocultas, enquanto na fase final do brinquedo, com o jogo adolescente e adulto, as regras se tornam claras, enquanto a situação imaginária fica subentendida ou oculta.

No brinquedo o significado se torna o ponto central, pois os objetos são deslocados da posição dominante que tinham na fase anterior do desenvolvimento para uma posição subordinada. Por isso, o brinquedo caracteriza um estágio de transição entre as restrições exclusivamente situacionais da etapa anterior e o pensamento adolescente e adulto, que se torna totalmente desvinculado das situações reais.

O atributo essencial do brinquedo é que uma regra se torna um desejo, então satisfazer às regras se torna fonte de prazer. Assim o brinquedo termina por criar na criança uma nova forma de desejos, ligando seus desejos pessoais ao seu papel no jogo e suas regras, fato que considera básico para o desenvolvimento da moralidade:

Ao contrário de Piaget, Vygotsky afirma que a criança não se comporta de forma puramente simbólica no brinquedo, mas busca realizar seus desejos, considerando que tal como operar com o significado de coisas leva a criança ao pensamento abstrato, operar com o significado de ações leva ao desenvolvimento da vontade e da capacidade de fazer escolhas consciente. Pois, no brinquedo, da mesma forma que um objeto substitui outro objeto, uma ação substitui uma outra ação.

Vygotsky (1998) finaliza suas considerações enfatizando que o brinquedo cria o que denomina “zona de desenvolvimento proximal”, pois nele “a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo é como se ela fosse maior do que é na realidade” Para concluir que “criança desenvolve-se, essencialmente, através da atividade de brinquedo” (p. 134-135).

Com Vygotsky já observamos diferenciações nítidas em relação a Piaget, a começar pela suposição de que o brinquedo não pode ser identificado com o jogo simbólico apenas, pois ele não tem a função apenas de preparar e favorecer as representações do real. Avançando ainda mais, afirma explicitamente que a criança brinca para realizar seus desejos, não para simbolizar. Disso, é possível dizer que enquanto Piaget se mantém num dualismo cartesiano, situando o brinquedo exclusivamente no plano intelectual, atribuindo-lhe tarefas específicas do desenvolvimento cognitivo; Vygotsky, talvez influenciado por Espinosa, que ele cita, busca superar tal dualismo, incluindo como ponto de partida do brinquedo o desejo, aspecto da afetividade. Deve-se destacar também na última citação desse autor a suposição de que o brinquedo se realiza numa situação diferente daquela da real, comum, cotidiana, e recorre ao termo zona de desenvolvimento proximal para caracterizá-la, se comporta como se fosse uma outra criança, mais velha do ela.

Mas, permanece como ponto em comum com Piaget o pressuposto de uma distinção entre sujeito e objeto, pensa-se sempre em uma criança que joga com algum objeto, caracterizando assim uma abordagem subjetivante. Busca-se descobrir a função do brincar, sua motivação e seus determinantes, mas sempre numa relação em que a criança (sujeito) e o brinquedo (objeto) já estão constituídos e diferenciados.

Para Deleuze, há um viés de transcendência que se abriga nesse pressuposto. Se quisermos ter uma concepção de sua imanência efetiva, o brincar como processo deve ser pensado antes da diferenciação sujeito-objeto. Assim, o brinquedo deveria ser suposto como algo que tivesse sua individualidade própria, ele vem à criança, a envolve e a faz devir, desterritorializando sua realidade atual e cotidiana.


II


Johan Huizinga (1872-1945)
Johan Huizinga (1872-1945)

JOHAN HUIZINGA (1872-1945), em sua obra Homo Ludens (1971, p. 53-54), defende a concepção de que “a cultura surge sob a forma de jogo, que ela é, desde seus primeiros passos, como que ‘jogada’”, citando que até as atividades envolvidas na satisfação das necessidades vitais assumem, nas sociedades ditas primitivas, uma forma lúdica. Mas, mesmo quando uma cultura evolui, para o autor, o elemento lúdico, não desaparece, apenas passa gradualmente para um segundo plano. Assim o elemento lúdico original fica completamente oculto por detrás dos fenômenos culturais.

Huizinga (1971) apresenta algumas das características fundamentais do lúdico, a primeira é a de ser uma atividade voluntária, o jogo deve ser livre, tornando-se ele próprio liberdade; enquanto a segunda é a de que o lúdico não acontece na vida “corrente” ou real, “pelo contrário, trata-se de uma evasão da vida ‘real’ para uma esfera temporária de atividades com orientações próprias” (p. 11). Algo assim como uma outra realidade, aquela da brincadeira, que a criança sabe e nomeia.

A terceira característica do lúdico é ser “jogado até ao fim”, ou seja, dentro de certos limites de tempo, se inicia e, em determinado momento, “acabou”, mas, enquanto está ocorrendo é movimento, mudança, alternância, sucessão, associação, separação. (p. 12). Como quarta característica, o jogo, mesmo depois de concluído, permanece como uma criação nova, uma invenção, um tesouro a ser conservado na memória. Sua quinta característica é que, apesar de romper com a ordem da “vida corrente” ou “real”, o jogo tem ordem, ele cria uma ordem, ele é ordem, a sua própria ordem, suas próprias regras que devem ser obedecidas de forma absoluta, a menor desobediência a esta “estraga o jogo”, priva-o de sua singularidade e de seu valor. Assim, o jogo exerce sobre os participantes um verdadeiro feitiço, ele é “fascinante”, “cativante” (p. 13).

Ao se considerar tanto a concepção citada do lúdico como suas características diferenciadas fica evidente como o autor consegue pensá-lo em sua imanência. O jogo é considerado como processo, como um plano de realidade no qual se produz, e do qual irá resultar uma diferenciação sujeito-objeto. Não se define o jogo a partir de motivações, necessidades ou qualquer outro conceito semelhante que satisfaça a uma subjetivação do mesmo. A atividade lúdica em si mesma se constitui num processo de produção de cultura, portanto de realidade e também de subjetividade. Fica evidente o movimento de desterritorialização em relação à realidade “corrente” ou de vida diária que o lúdico produz, numa facilitação do Devir.


Jacob L. Morenos  (1889-1974)
Jacob L. Morenos (1889-1974)

Jacob Lev Moreno (1889-1974) a partir de suas experimentações com o Teatro da Espontaneidade, chegou ao Teatro Terapêutico ou Psicodrama. Em uma das maneiras de se referir ao efeito psicoterapêutico das representações no palco psicodramático, Moreno (1995) propôs o conceito de “realidade suplementar” (surplus reality). Para explicá-lo, diferenciou três tipos de realidade: infrarrealidade (infra-reality), realidade atual e realidade suplementar. A primeira delas caracteriza o consultório do psicanalista, ou qualquer outro psicoterapeuta que atua apenas no plano da linguagem, que, para Moreno, se constitui numa espécie de “realidade reduzida” ou “infrarrealidade”. Numa entrevista, uma situação de investigação, tal como na aplicação de uma técnica projetiva, tudo que ocorre ao paciente, como, por exemplo, uma ideia suicida ou um sintoma qualquer, não pode ser atualizada ou “atuada” diretamente, mas deve permanecer no nível da imaginação, do pensamento, do sentimento etc., ou seja, apenas como representação.

O segundo tipo de realidade, a atual, se refere àquela da vida mesma, da vida cotidiana, em seus vários contextos sociais. A forma como esta vida ocorre, muitas vezes, revela grandes dificuldades e problemas, para cujas soluções seriam necessárias mudanças nesta realidade atual. Todavia, efetuar estas mudanças pode significar problemas ainda maiores, comprometer ainda mais as relações que se queria melhorar. São os conflitos daí resultantes que servem de motivação para a busca pelos psicoterapeutas, na maioria das vezes.

A realidade suplementar (surplus reality), uma “realidade a mais”, foi cunhada por Moreno (1995), como ele mesmo assume, sob a influência do conceito de mais-valia (surplus value) utilizado por Marx, em O Capital, para se referir ao valor do sobretrabalho que o capitalista se apropria a partir do trabalho do operário. Moreno lembra que, entretanto, “suplementar” (surplus) não tem o mesmo significado em psicoterapia, é só um termo análogo, neste caso significando que existem dimensões invisíveis na realidade atual, cotidiana, nem expressas nem experimentadas completamente. Para chegar a descobri-las é necessário o recurso a instrumentos suplementares dentro da situação terapêutica.

Moreno (1995), ao se referir à psicoterapia, propõe a construção de outro plano, de outra realidade, na qual gradativamente o indivíduo se insere. Não é por outra razão que ele encontrou no teatro, ou na brincadeira de faz-de-conta, portanto no lúdico, o modo de efetivá-la. Trata-se assim de uma busca por manter-se na imanência dos acontecimentos, construindo uma realidade suplementar à da vida cotidiana na qual eles possam ser reapresentados, extraindo deles as linhas de ações que os produzem. Aspecto que também é enfatizado por Vygotsky e Huizinga. Trata-se, em termos esquizoanalíticos, de um movimento de desterritorialização que favorece o Devir.

No entanto, ao afirmar que o termo “suplementar” se refere ao acréscimo de dimensões invisíveis da realidade que não são conhecidas e precisam ser descobertas, Moreno postula algo além da imanência, algo da ordem do oculto, do latente, não acessível ao indivíduo, inconsciente e que precise ser acessado, assim como se crê na Psicanálise. Por isso, doravante, sempre que usarmos o conceito de Realidade Suplementar, estaremos deslocando-o do território moreniano pela supressão deste aspecto que apela por um plano de transcendência. Para nós esta realidade é suplementar no sentido de oferecer, como diz Huizinga, uma “evasão da vida real” ou Vygotsky, que se refere a uma saída da situação real, na qual além do mundo ilusório e imaginário do faz-de-conta a criança age como se fosse mais velha. Realidade Suplementar passará a significar para nós apenas uma outra realidade construída ali e então, num Plano de Imanência, por imaginação e lembranças.


III

Mas, se, como expusemos em nosso primeiro post sobre Aprendizagem (APRENDIZAGEM: UM ENCONTRO COM OS SIGNOS: OCCURSUS), não há método para aprender, pois nunca se sabe como alguém aprende, existem caminhos ou estratégias que podem facilitá-la ou favorecê-la.

Naquele post também apresentamos o conceito de Aprendizagem proposto por Deleuze como consistindo em conjugar “pontos notáveis” do corpo (ou da mente) de quem aprende com os “pontos singulares da Ideia objetiva” (os signos), sendo que esta conjunção se constitui como um “campo problemático”, ou seja, algo sempre por se fazer, um Devir. Mas, fazíamos ainda referência a que, cotidianamente este tipo de Pensamento não é o que nos ocorre, “naturalmente”, comumente, pelo contrário, na vida diária apenas praticamos recognições ou reconhecimentos das representações que construímos, ou que outros construiram e nos impuseram, sobre a realidade, uma outra forma de nos referirmos aos conceitos. Vivemos sob o império de uma Imagem Dogmática do Pensamento, como diz Deleuze, origem de todos os dogmatismos.

Falamos ainda de como a cultura e a escola praticam, quase que exclusivamente o que Deleuze se refere como Saber, conjunto de conceitos ou representações sobre a realidade que se acumula ao longo do tempo em um dado contexto sociocultural. O saber é o oposto da Aprendizagem, ele impede a ocorrência dela, pois quando reconhecemos algo a partir de um conceito ou representação, dispensamos o trabalho de aprender, reconhecemos e nos damos por satisfeitos.

Neste contexto, é fundamental, para que a Aprendizagem ocorra, que se recuse a recognição ou reconhecimento conceitual, que se penetre a realidade do que está diante de si, se envolva com ela e então realize a conjunção de partes notáveis do corpo com os pontos singulares da ideia objetivada naquela realidade, constituindo assim o “campo problemático” que irá conduzir a Aprendizagem.


François Zoutabichilli ( 1966-2006)
François Zourabichvilli (1966-2006)

François Zourabichvili (1966-2006), um dos mais renomados alunos de Deleuze, em sua obra “Deleuze - A Filosofia do Acontecimento”, se refere à tarefa de recusa da recognição ou reconhecimento como a “escavação de uma profundidade na representação”, ou seja, que diante de algo que toque nossa sensibilidade, tão logo nos ocorra uma recognição ou reconhecimento conceitual, recusemos dar consequência a eles, buscando encontrar no “algo” os pontos singulares que o constituem como uma ideia objetivada, os signos que o caracteriza, que constituem aquilo nele que me toca, que me afecta. Uma vez identificado os signos, passamos a identificar os “pontos notáveis” do nosso corpo que são afectados por eles. Para então, verificar que essa conjunção constitui um “campo problemático”, nunca dado a priori, mas que se reconstitui a cada movimento de busca de resposta a ele, produzindo todo o Devir da Aprendizagem e o conduzindo.

O fundamental para compreender esta “escavação de uma profundidade” na representação é a admissão de que o real é múltiplo, todo ser é uma Multiplicidade, só há multiplicidades. Portanto, em qualquer ser, coisa ou ente deve-se buscar sempre a Multiplicidade que o constitui. Para Deleuze, a Multiplicidade se constitui de pontos, partes ou partículas e as relações entre eles. Ser afetado por algo é ter a nossa sensibilidade impactada por alguns dos pontos dessa multiplicidade, os quais serão referidos como singulares (os signos), no sentido de terem a propriedade de nos afetarem, distinguindo-os dos demais que são referidos como pontos ordinários. Do nosso lado, nesse processo de afecção, no nosso corpo, também se dá uma diferenciação análoga, das partes que nos constituem, e que podem ser supostas num dado momento, algumas são afetadas pelos signos (os pontos singulares) e são referidas como “partes notáveis”, enquanto as demais continuam como “partes comuns”. Em síntese, escavar uma profundidade numa representação de “algo” é diferenciar os pontos singulares da ideia objetivada nele (os signos) e as partes notáveis do nosso corpo que são afetadas, que uma vez identificados colocam sua conjunção como um campo problemático.

Um exemplo disso é o que acontece no processo de aprendizagem da Alfabetização. A escola dispõe de inúmeros métodos, inúmeras “cartilhas”, inúmeras práticas acumuladas pelas professoras, cada uma a seu modo buscando encontrar a melhor maneira de conseguir que o aluno leia e escreva. No entanto, como demonstram as pesquisas mais recentes, a partir de diversos referenciais teóricos, há uma descoberta que é fundamental para que ela ocorra, aquela da chamada por alguns de hipótese silábica ou alfabética, por outros de relação fonema-grafema, a qual, nos termos aqui apresentados pode ser descrito como levar o aprendiz a descobrir que, para ler e escrever, antes de tudo, é preciso que os signos da leitura e escrita se destaquem naquilo que se propõem que ele leia e escreva, os textos, as palavras, as sílabas ou as letras. Ao mesmo tempo que, no corpo do aprendiz se destaquem “as partes notáveis” que irão se conjugarem com esses signos. Ou seja, o que se precisa é “escavar uma profundidade” sob a representação da alfabetização, originando o “campo problemático” que irá conduzir essa aprendizagem. Assim, por exemplo, é preciso que o aprendiz saiba que ele precisa “atentar” ou se deixar afetar pelo signos sonoros, os fonemas, jamais pelos signos visuais, erro que leva aos chamados “copistas”, alunos que conseguem copiar, ou seja, reproduzir os signos visuais da escrita, mas não conseguem ler, decodificar os signos sonoros, fonemas, da escrita.

Neste sentido, qual seria o ambiente lúdico que favoreceria a Alfabetização? Evidentemente não aquele que, na educação pré-escolar, tanto se enfatiza, desenhar, recortar, pintar etc., todos afetados por signos visuais. Mas, algo da ordem de uma oficina de música, na qual se leve os aprendizes a iniciação na notação musical. Algo assim como fez Antonio Leal em sua experiência bem-sucedida publicada como “Fala Maria Favela”, na qual entrou com um tambor numa sala de aula, no primeiro dia do processo de alfabetização de alunos que, infelizmente, após anos repetidos, não conseguiam ler nem escrever.

Um detalhe importante, para a Deleuze, não se trata de “explicar”, “ensinar” ao aluno o que é importante, a conjunção signos e partes notáveis do corpo, isso tem que ser “vivido” por ele. É como se sua mente não estivesse pronta para compreender o que a professora tanto repete em seus ouvidos, o que ela precisa e viver experiências nas quais os signos e as partes notáveis estejam envolvidas, para que a conjunção vá se formando gradativamente em sua mente. Por isso citamos a pré-escola e a iniciativa de Antônio Leal, não dizer nada, não explicar, não tentar ensinar, levar o aluno a vivenciar, permitir que nele se construa a conjunção e, então permitir que ele a exercite, mais e mais, pois a cada vez, um novo campo problemático se cria e se impõe a ele, produzindo novas soluções, novas respostas ao problema. Por isso, não há métodos, não existem atalhos, é preciso deixar a Diferença agir, fluir, é o Fora, a Aprendizagem que tem suas próprias regras, elas não podem ser controladas ou produzidas pelo professor ou pelo aluno. Por isto dizemos que temos que fazer fugir o professor, para que advenha o Devir-intercessor e que fuja o aluno para vir o Devir-aprendiz, ambos pólos de um Acontecimento imprevisível, um Occursus, um Encontro fortuito com os Signos, a Aprendizagem.

A Realidade Suplementar assume sua nova função, constituir-se no Ambiente Lúdico que favorece o Occursus, Encontro com os Signos, Agenciamento e Aprendizagem, que demanda, de um lado, o Devir-intercessor e de outro o Devir-aprendiz.


REFERÊNCIAS:

DELEUZE, G. Diferença e repetição. (L. Orlandi, R. Machado, Trad.) (2ª ed.). Graal. 2006, p.: 236-240 (Trabalho original publicado em 1968).

HUIZINGA, J. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Tradução de João Paulo Monteiro. São Paulo: Perspectiva, 1971.

PIAGET, J. A Formação do Símbolo na Criança. (Trad.: Álvaro Cabral e Christiano Monteiro Oiticica). Rio de Janeiro: Zahar, Ed., 1975.

VYGOTSKY, L. S. Formação Social da Mente. (Trad.: José Cipola Neto, Luís S. Menna Barreto e Solange C. Afeche). São Paulo: Martins Fontes, 1984.

ZOURABICHVILI, F. Deleuze: uma Filosofia do Acontecimento. (Trad. Luiz B. Orlandi). São Paulo: Ed. 34, 2016, p.: 51-75 [Ed. orig. 1994].



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